ORGIA ENLATADA


Tudo ali no meio gritando enlouquecido, pulando, gozando, cagando, eu nem mais sabia o que estava fazendo no meio daquilo tudo. Até latido de chihuahua e um pintinho canino duro depois de uns afagos eu vi. Só sei que de alguma maneira fui parar no meio daquilo, de começo não queria, mas ela insistiu e tudo o mais, até fez anal comigo dias antes, só pra agradar, me apaziguar, fingiu até um orgasmo, que amor.

Agora eu estava ali, todo mundo fudendo todo mundo, fudiam sem dó, metiam com força e no meio da confusão de vozes alguém sorria, os dentes alvos todos ali, nem todos alvos, muitos amarelos também, e nem todos ali, faltavam alguns na boca de alguém. Gente de pouca instrução, mas que pareciam ter grande certeza daquilo que diziam sobre os outros, como todo bom civilizado, uma segurança comparável aquela das pessoas que não sabem o que fazer, mas que ficam lá fuçando até sentir alguma coisa e.. Ai! Gozei. Como uma ninfetinha brincando com o clítoris. Algo por ai.

Uma era velha, mas só no espírito, o corpo até era conservado, com a luz e a bebida certa voltava a ser o que era antes. Um era alto e mal encarado, daqueles tipos que parecem ter abdicado do cérebro por alguns vinténs e muitas ordens. Sorrisos cerrados, falavam pouco um com o outro, decerto fim de relação. Mas insistiam por algum motivo. Pareciam gostar de violência e ordem. A velha de fato era mais pacífica. Pareciam se importar muito com muitas coisas sobre mim, eu não me importava com nenhum deles.

Tomei o café. Amargo. Gosto amargo, mas tinham errado na proporção. Eles continuavam com a orgia, uma coisa macabra, umas opiniões horrendas, só fodiam com todo mundo. Era só isso que eu via na sala de estar da minha namorada. Um bando de gente que fodia todo mundo, mas que não conseguia perceber que também estava sendo fodida. A velha tendo orgasmos falando mal da outra velha. Todos concordando com preconceitos universais. E falavam mal dos cabeludos e dos maconheiros e dos gays, menos o grandão, esse parecia meio confuso com a coisa toda, principalmente quando o assunto eram os gays.

Precisava de um bebida, olhei o café, sabia que não tinha bebida, eram de alguma dessas igrejas que prometem salvar o mundo, mas não conseguem nem tirar uns poucos da miséria e ainda pioram a situação surrupiando o que os coitados ganham com muito suor e pouco reconhecimento. Ainda falavam de coisas da tv, o mesmo de sempre: o verso de um música dançante, um escândalo qualquer, corrupção, violência, etc. Alguém fazia comentários do tipo Arnaldo Jabur, mas sem dicção ou coesão ou coerência ou lógica ou análise ou qualquer coisa que possa ser chamada de inteligência. Só o vigor mantinha semelhante ao do homem.

Todos concordavam e o silêncio voltava, falavam um pouco, depois me perguntavam algo, fui mentindo: minha família era estabilizada, eu amava a filha deles, eu queria algo pro futuro, eu trabalhava, eu morava, eu me importava com as coisas e esse blablablá todo que todos acham que todos devemos nos importar, até que:

"Você acredita em deus, não?"

Uma lá perguntou.

"Retire o sujeito, o verbo transitivo indireto e objeto indireto da oração... Será minha resposta."

Me olharam meio tortos, "oração!", disse outra, "então ele é cristão!".

Ela sabia o que ia acontecer, me olhou pedinte, como um cão com fome ou um mendigo louco por um trago. Se ela fosse o mendigo, chamava pra beber comigo, mas eu sabia que não iria, sabia que a minha namorada nunca abdicaria da estabilidade da sua liberdade assistida em favor da instabilidade da vida real. Fui atrás de um mendigo pra beber depois de um "eu acredito que vocês são um bando de hipócritas truculentos, falsos, blasfemos e ignorantes. O café 'tava uma merda, sua filha também e suas opiniões me fizeram ficar com vontade cagar pra me livrar de toda a porcaria que ouvi hoje, não gostei nem do cachorro! Vou sair pela rua e procurar um mendigo pra beber umas, ao menos ele se importa com as coisas certas".

Solteiro, bêbado e satisfeito. A vida perfeita.

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