Estou com a interface de um software editor de texto aberta diante de
meus olhos enquanto escrevo. Esta página branca virtual lentamente sendo
preenchida com as letras destas palavras é a única fonte de luz no quarto,
assim como a chuva e meus dedos são os únicos provedores da trilha sonora desta
trama.
Eram.
Eis que surge uma mosca que, atraída pela fonte de luz, tornou-se uma
nova provedora de sons para minha audição. E que péssima provedora de sons uma
mosca consegue ser... Intrometendo-se na execução da trilha que eu havia
escolhido para este conto.
Eu sou apenas alguém qualquer tentando escrever a própria história e considero
a mosca uma dificuldade que surgiu na construção da minha história.
A mosca influenciou tanto o rumo do que escrevo que a altura desta
frase a palavra “mosca” já foi digitada 5 vezes.
Consegui.
Enquanto a tosca mosca batia na tela do computador no contratempo da
trilha pretendida eu a surpreendi com um peteleco. A mosca foi arremessada e não
vai mais me atrapalhar.
A chuva parou e agora, se meus dedos param, já não possuo trilha
sonora para este conto. Entre os silenciosos intervalos destas letras, eu
percebo a mosca caída sobre a mesa, seu corpo está morto, dilacerado. O
peteleco de meu dedo foi o estupro fatal para a vida deste inseto.
A mosca viveu uma vida de mosca até seu último segundo, nenhuma mosca
age como um chimpanzé nos segundos que antecedem a morte. Essa é a realidade.
“Moscas utilizam a luz para orientar-se. Eu sou uma mosca. Você me
atraiu e me matou por causa disso” – no universo imaginário onde uma mosca
transmitisse esta reflexão por via telepática no momento da morte, seria
natural sentir culpa.
Mas no universo chamado realidade, este onde nenhuma mosca é
telepática, não me culpo pela morte da mosca, culpo-me apenas por ter deixado
uma mosca ser tão importante para minha história.
Fim.
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