A MASSAGEM EXTRA-ANCESTRAL


Ardia uma tarde quente em cima do velho barco. Nos olhos de mais de meio século ardiam esperanças. Canales ansiava por chegar em terra. Deixava sua prole, a mulher que não mais amava e histórias estranhas na sua ex­pátria, Venezuela.

A chegada em terra era apenas passo pequeno. Uma longa viagem o esperava. Para atravessar o vasto território das matas belas dos trópicos e das praias ensolaradas até os verdejantes campos do sul.

Mera ilusão. Mero olhar despreparado. Entrava ele na fornalha. Passaria pelas fumaças. E continuaria entre prédios antigos e novos. Gigantes indústrias. Vacas, frangos e porcos confinados. Mas talvez isso não interferisse no seu sonho.

Depois das pequenas náuseas no barco velho. O desembarque desesperado. A caminhada ofegante, engolindo terra seca. Sufocando em restos de fumaça de carvão. No caminho a salvação vinda de um jipe. Velho jipe, velho homem dirigindo.

Prosseguiram viagem. As conversas curtas. Indagações e pequenas constatações do clima e da vida. Desembarcou num vilarejo pequeno. Alguns bares e pousadas. Descansou numa dessas de qualidade duvidosa, mas de valor pequeno a se pagar. Na noite que se aproximava foi pro bar.

Um desses bares de madeiras. Cachaças e homens que acabaram de trabalhar. As luzes amenas. Resmungos e batidas de copos no balcão. Ele sentava num canto, tentando passar despercebido. Mas por ali qualquer novo trauseunte era notado, sentido.
De perfume pertubador. Aproximou­se dama bela do então homem há pouco chegado. Sentou­se com olhar fixo. Pediu para ficar. No calor da noite caindo. No beber dos corpos enebriados. Iam-­se risadas. Toques. Troques de olhares.

No fim da noite no bar. Arrastando os pés iam todos. E homens cambaleando. E os dois, um no outro, se sustentando. Na cama da pobre pensão cairiam sobre os lençóis.
De mãos suaves e macias, fez­lhe ela mil carícias. Massagem quase transcendental. Arrepiou­lhe todos os pelos. Num desvario contente. Sentiu arrepio até nos dentes...que não mais existiam.

E foi num arfar de carícias. De um sugar de bocas e passar de mãos. Que a noite fez­se plena por inteira. E ele e mulher tombaram no chão.

Ainda estava ele extasiado. Seu meio século de vida sugado naquele momento nos braços da bela dama. Dormiu sossegado. Extravasado os pecados de sua necessidade humana. Ela, moça sabida, fez das mãos rápidas e ligeiras um levantar de
moedas. E foi. Saiu. Deu partida.

Quando acordou, Canales, viu o sucedido. Seus não muitos níqueis, surrupiados. Não tinha muito a fazer. Reclamou na pequena delegacia. Mas não iria esperar a salavação que não viria.

Explicado estava o caso da bem apessoada moça deitar­se com um jaguara daqueles. Que de bom tinha simpatia. O resto nada trazia. Sem maiores formas de agrado. Sem maiores regalias.

Sentado na frente da pensão. Agarrou a mala que tinha e foi­se em direção a estrada mais próxima. Que o pusesse em destino mais longe possível dali. A caminho da sua terra prometida.

Pedindo carona. Pedindo carona. Foi de trecho em trecho. Nas boléias. Nas carrocerias. Vez ou outra num banco bem estofado. Debaixo de zinco, ferro e lona. Pedindo carona.

Mas nem tudo é sorte, festa, viagem. Uma rápida freiada. Um carro enorme. Lá foi ele e sua bagagem. Parecia só mais uma. Uma ida. Um passo ao destino desejado.

No ir do ronco do carro. Marcando o asfalto quente. O motorista fumando cigarro. Uma mulher alta de boca vermelha no banco ao lado. Ele na traseira. Em silêncio. O sorriso agradecido. Amarelado.

Entram eles em um desvio estranho. Ele não sabe o que exatamente pode vir a suceder. Talvez nada demais. Quebram numa esquina de rua estreita e com árvores a rodeá­la. Seguem por outra ruela, cada vez menor. Param em frente a uma pedra imensa que se ergue bicuda até os píncaros.

Tudo fica estranho. Já não se sente seguro Canales no fundo do carro. Descem ambos, casal sinistro. Num piscar de olhos, outros idênticos casais protuberam­se detrás da pedra.

A porta do carro é aberta. Já não sabe Canales o que faz. Na tentativa de fuga é desastrado. Paralisado. Estaqueado imóvel em frente a pedra. Desta um feixo de luz emana. Ele já tem o destino traçado.

Sem esforços maiores. Vai sendo molestado. Despem suas roupas. A barriga pretuberante. As rugas da idade que se aproximava. Um choque entra­lhe entranhas abaixo. Entornam um líquido azul goela adentro. Sufocando. Delirando. Engolindo dores e um novo talento. Sentindo uma coceira nas mãos.

Numa febre intensa, figuras de histórias pretéritas caem em sua mente. A filha, menina mais velha, deixada pra trás com a mãe. Numa tarde ensolarada. Na beira de um rio que passava rente a velha casa que morava. Banhando­se nua estava na flor de seus décimo quarto abril.

Ele de longe admirava. Mais perto. Passo a passo caminhava. E ia assoviando. A filha meio estranhada. Ele a tocando. Carinho. Massagem rara. Prazer, culpa e tesão.

De volta ainda pasmado. Acordou de novo no carro. Deixado numa estação. De lá com uma passagem que não sabe como comprara ou de quem ganhara. Partiu naquela direção.

Não se sentia confortável. Mas sabia que algo ali havia mudado. Tinha um sinal nas mãos. Chegando no destino apontado. Esperava-o um jovem homem e um menino. Placa com seu nome na mão.

Caminhando sem controle. Foi ter com os mesmo. Explicada a situação meio torpe e sem sentido. Convidado a fazer parte da clinica de massagem exotéricas. Aceitou sem muita reclamação. Lembrous-se no fundo o que queria. Quando da sua pátria partiu. Ser ator comediante e fazer riso nos seus.

Mas depois da carona estranha. Só sabia que devia seguir o que o misterioso destino lhe deu. Sem muita necessiadade de estudo. Foi desmembrando os segredos da exotérica massagem. Na sua cabeça, ainda enebriada, percebia que nos recintos de trabalho. Quando a tarefa ia ser findada. Que de sua mão emanava brilhante luz azul-celeste.

Os massagiados então tremiam. Pareciam ser estuprados astralmente em outro plano. Depois voltavam confusos. No entanto felizes. Seguiam destinos pré-destinados. Sumiam no mundo calados. Iam a outros confins. Enfiavam os sonhos de outrora dentro de suas cacholas.

Caminhavam com as mãos assinaladas. Tocavam outros ainda impuros. Num processo de transmutação. Iam povoando o mundo. Uma nova era consolidada. Uma nova estação se anunciava. Os passarinhos não cantavam mais as velhas músicas nas gaiolas. Assovios ultra-cósmicos. Poesias intergaláticas enchiam as ruas das casas.

Dançavam alegres as senhoras sobre ondas de partículas desconhecidas. Dedilhavam-se as doces meninas em transes celestiais. MAssageavam-se em orgias cosmopolitas como seus extra-ancestrais. Canales prosseguia sua missão mal explicada. Resultado estrambólico de consolação era sempre anunciado. E as mãos que assumiam o psicodélico fado, sua recompensa onírica tinha num sonhado tratado sua justificação.

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