“Hoje é um dia, ou hoje é o dia, talvez o dia que me faz pensar naqueles
outros dias, quando eu simplesmente vivia os dias, sem deixar os dias
dissiparem os próprios dias, que se iam consumindo sem ver os dias que
vinham após dias, seguindo mansos e bravos em direção de mais dias... Só
que não tem mais dias, e os dias não consomem outros dias e não se
pode esperar mais dia algum, pois de dias morreu o espera por aquele dia.”
Pensei em mandar esse poema para ela, contudo, pareceu-me muito
redundante, o que para um poema não deveria ser estranho, afinal, eles
redundam, faz parte da sua natureza. Contudo, não era a natureza que eu
buscava, não poderia sê-la, a natureza havia reduzido o que éramos ao nada
que agora somos: dois depravados buscando orgasmos pelo webcam.
A ideia inicial fora dela, queria exibir os novos movimentos que tinha
aprendido nas aulas de dança do ventre. Com o véu negro em mãos, disse, do
outro lado do estado, para eu imaginar que aquele pano era as minhas mãos.
Tencionou-o para em seguida friccioná-lo sensualmente por entre as pernas
volumosas, o tecido foi e veio com delicadeza voraz por entre os lábios rosadas
da vagina inundada de prazer.
Um prazer que não emanava do ato, mas das expressões contorcidas do meu
rosto dilacerado pela vontade de tomar a cintura delineada e perfeitamente
construída pelas fantasias da minha cabeça apaixonada, que só fazia
remover daquela massa os problemas há muito por mim detectados no tempo do
namoro.
Agora, contudo, o que dançava não eram aquela barriguinha encolhida com
fervor ou as nádegas precocemente derrubadas pelo tempo e habilmente
empinadas pelos movimentos corretos, o que eu via eram as linhas sinuosas
de uma odalisca do deserto com contornos cobiçados por todos os sheiks
desde o tempo de Maomé.
Eu ali, literalmente com o pau na mão, já sentindo o cuspe da vida
abandonar o canal deferente em dois minutos de dança, controlei-me e
aguardei, eu queria vê-la com os próprios dedos na vagina, entrando fundo
em direção ao útero. Ela do outro lado, porém, não introduziu os dígitos na
caverna divina, porém levou-os à proximidade dela e rebolou jogando os
quadris para um lado, depois para o outro com uma sensualidade sensível e
dócil, mas com uma gana selvagem querendo explodir.
Ato contínuo, ela atirou-se na cama virando consigo o computador e a
minha atenção primitiva. O indicador e o anelar da mão direita saltaram
rapidamente para o clitóris inchado pelas minhas expressões depravadas e
pelo ego feminino satisfeito por despertar o desespero em uma alma escrava
do prazer praticado com a arte sublime das divindades venusianas. A tela
tremia junto com os movimentos que arrancavam lascas grossas de prazer de ambas
as partes. Eu, do meu lado da tela, já tinha alcançado meu ápice, todavia,
senti-me na obrigação de fingir que aquilo tudo me agradava, fingi algumas
caretas enquanto ela masturba-se forçadamente no início, mas com leveza no
final, senti que não era exatamente o que ela queria, porém, quando mordeu
o lenço que era as minhas mãos – exatamente como fazia para segurar
os gemidos primais em nossas inúmeras noites de sexo –, percebi que não
voltaria mais, apertou- curto que me fez ejacular instantaneamente.
Senti-me vazio depois do sexo sem contato, aquilo parecei fazer todo o
meu “sentimento” por elas esvair-se, então eu entendi que não amava,
sequer gostava dela, nem mesmo a respeitava, percebi que ela era um objeto
de prazer, que eu ainda não estava disposto a me livrar, apesar das opções
que circundavam. A sensação de ter aquilo que me era dificultado parecia
impelir-me o desejo de tê-la. Procurava os seus defeitos e os maquiava com
a imaginação das minhas mãos moldando sua bunda macia ou olhava horas a
fio as fotos por mim imploradas e por ela cedidas para acariciar a própria
falta de amor próprio, que a impedia também de livrar-se daquela situação
prazerosa e atormentada.
E o poema ainda em suspenso depois de todas as lembranças de uma noite
virtual assemelhada aos dias em que vivíamos dia após dia procurando o dia
em seríamos felizes. Um dia talvez em que todo o ódio de nossas brigas
tornasse-se um sentido puro sem odor de sêmen e fluídos vaginais ou gemidos
oriundos de descontroles musculares. Um dia talvez em que outro dia escuro
qualquer não exigisse a saliva de pessoas estranhas, dia esse que não mais
recorreria aos dias, mas que dia e só dia, o único dia em que ficaríamos juntos
sem nos preocuparmos com os dias vindouros.
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