O FLAUTISTA


Vivia num campo de cogumelos, o Campo dos Cogumelos Elísios. Ali o Tempo não ia nem vinha, ficava onde estava; inerte e preguiçoso, só mais vadio que as horas que cismavam em nada fazer era um tal de Flautista, era esse mesmo o nome, ao menos era por esse substantivo próprio que ele atendia quando era solicitado pelo seu exótico harém.

Muitas culturas têm haréns, muitos animais têm haréns, e uma característica em comum tanto entre os animais e as tais das culturas é que cada qual, ao seu modo, toma para o seu ninho de sacanagem somente o sexo oposto da própria ESPÉCIE. Nosso Flautista sempre achou essa coisa de espécie bem chata, e por isso era conhecido em todo o Mundo Desconhecido por possuir o único harém de ruminantes do Planeta (que nessa época ainda era plano).

Quando não estava coçando o saco, estava tocando flauta, apesar do nome pelo qual era conhecido, não era lá muito bom flautista, ainda mais porque passava (apesar do Tempo não passar) boa parte do tempo coçando o saco, o quê o impedia de tocar flauta com frequência. A impossibilidade de gozar dos dois prazeres concomitantemente era objeto de constante reflexão ao Flautista. Para esquecer esse grandíssimo problema de ordem prática, o Flautista, depois de muito coçar e pouco tocar, se decidia sempre a comer cogumelos, Cogumelos Elísios.

Como o Flautista era o único humano da região, era natural que se tornasse o líder do campo, não por ser o mais inteligente do lugar, bem longe disso, e sim por poder SOPRAR (e até articular o sopro). Era somente essa a característica que o tornava singular naquelas pastagens, e quando digo pastagens, realmente estou falando de pasto, aquele mesmo de gado. Para qualquer lugar que se olhasse havia gado, esterco e pasto... um flautista preguiçoso e... um touro, sem chifres e broxa.

O touro, convenientemente conhecido como Touro (afinal ele era o único que por ali habitava) era bastante velho, frustrado e gostava de beber suco de uva. Mas como por ali não tinha uva, ele acabava sempre de mau-humor. A falta de suco de uva, contudo, era o menor problema do Touro: o que realmente o incomodava era que TODAS as vacas do pasto o rejeitavam, não por viver desarmado, e sim por apreciarem os agrados do Flautista! O Touro não conseguia entender a preferência delas. Faziam tudo para o Flautista: defecavam perto dos lugares onde o flautista costumava dormir, assim ele não teria que andar muito quando um cogumelo Elísio resolvesse sair de dentro do esterco (era assim mesmo: o cogumelo RESOLVIA SAIR ou NÃO)... bem... era só isso o que elas podiam fazer, afinal eram vacas! Ah! Outra coisa que faziam (e isso incomodava o Touro muito mais do que o seu falo morto e muito muitíssimo mais que a falta de suco de uva) era se posicionarem em barrancos estrategicamente posicionados para serem, ora, barranquiadas.

O Touro não perdia um só Ritual do Barranco, olhava todos, talvez para conservar o ódio ou para relembrar de tempos antigos (apesar de não existirem, pois ninguém ao menos se lembrava da última vez em que o Tempo havia saído para dar um volta). Sempre antes de mergulhar a rola no tanque vaginal da vaca, o Flautista tocava uma música singular, uma música ruim, uma música com duas notas: uma aguda e desafinada e outra grave e também desafinada, só depois ia brincar de barranquear.

A cena ia e vinha (ia e vinha mesmo), e o Touro não compreendia o “por que” de toda a coisa. Então um dia, depois de muito matutar, matutar, matutar, matutar, matutar e matutar, o idiota descobriu o centro de poder do Flautista: era a flauta! Por isso se chamava Flautista! Ter chegado a essas conclusões fez o Touro não dar utilidade alguma a elas, pois o êxtase da descoberta foi tanto que o pobre do bicho acabou tendo um orgasmo mental, o que terminou por causar-lhe uma sequela bastante constrangedora: passou a pensar ser uma VACA! O Flautista apreciou o acréscimo ao seu harém.

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