Os Personagens
Lord Ernest: homem de altura mediana. Costeletas
esbranquiçadas. Sempre de terno muito bem alinhado. Possui uma pinta negra
discreta no meio da grande testa. Carrega consigo sempre um lencinho branco,
pois sua muito. Possui fama de libertino. Vive na noite Boêmia. Sempre rodeado
de belas mulheres, fumando charutos e tomando conhaque.
Lord Roni: Distinto senhor de meia idade. Muito culto e
dono de uma excelente oratória, embora permaneça mais tempo calado e escutando.
Adorador dos ritos do chá das cinco. Não perdoa atrasos.
Jurema: Empregada de Lord Roni. Uma das criadas mais bem
tratadas da casa. Tem acesso a tudo. Ouve tudo. Sabe tudo que se passa naquele
teto. Apesar de estar acostumada, não se sente a vontade na presença de Lord
Ernest.
Linda: A porca de estimação de Lord Roni. Sempre
paparicada. É quem muitas vezes dita as regras da casa. Já que nada pode ir
contra seus caprichos suínos.
A Chegada
A tarde caia. Na varanda três degraus acima do chão. Lord
Ernest. Acabara de chegar. Pontual como sempre. O chá das cinco estava sendo
preparado.
- Sempre pontual, caro amigo - disse Lord Roni.
- Sempre, sempre! - respondeu alegremente Lord Ernest.
- Mas entre logo. O chá já está a mesa. - disse Lord Roni,
encaminhando-se e levando consigo o amigo para a sala.
O Chá
As xícaras foram cheias. Os bolinhos estavam quentes. Os
senhores tomavam chá elegantemente.
- E Linda, como está?- perguntou despretensiosamente Lord
Ernest.
- Muito melhor agora. Gastei mais de 2000 níqueis em seus
cuidados nos últimos dias. Pois bem sabes, está grávida e é muito sensível, coitadinha. Quero que tudo ocorra bem à minha Linda.
- Claro. A bela Linda não substitui uma bela dama, mas
deve satisfazer-te nas horas em que não há uma mulher presente e disposta a
saciar-te. Deves sempre cuidar da menina.
- Ha, ha! Muito espirituoso de sua parte, meu amigo.
-Ora, Ora! Sejamos francos. A porquinha tem uma bela
rabeta.
Ao lado da mesa, um pouco distante, Jurema calada,
despreza intimamente aquela criatura.
Pacientemente Lord Roni falou:
- Tenho amor àquela porquinha. Mas nunca ousei tocá-la da
forma como estás insinuando.
- Nunca?! - Exclamou Lord Ernest. - És um homem que não
entendes nada de prazer. Eu...aahh..meu amigo. Já teria adentrado às lindas
ancas de Linda. Huá! Huá! Huá!
- És um homem muito voluptuoso.
- Não. Acho que tu que és. E ainda disfarças muito bem.
Aposto que esta ninhada tem um toque seu também.
- Ahhh! Horrendo! Horrendo! - gritou Jurema e saiu
correndo em direção à cozinha.
- Tuas palavras deixam a mim constrangido. Imagina a uma
mente tão ingênua quanto a de Jurema. És terrível, homem. Guarde suas
promiscuidades para as conversas na taberna.
- Libertinagem. Voluptuosidade. Luxúria. - Exclamou
eufórico Lord Ernest, ignorando o que o amigo dizia. Mexia os braços
exageradamente. E de tempo em tempo limpava o suor da testa com o lencinho
branco e prosseguia:
- Liberte-se, meu amigo. Rasgue as amarras das convenções
pragmáticas que lhe aprisionam. Rompe teu cásulo de falsa moralidade. Deixe os
vícios te ludibriarem. O sexo te corromper de prazer. Jogue-se no posso da
libertinagem. Lá dentro há faunos e ninfas num esfregar-se eterno. Escorre o
líquido profano dos falos fáunicos e o mel agridoce das belas rachas das belas
ninfas. Sede profano também. Beba do vinho que escorre da devassa sarcedotisa
de Príapo. Embriague-se e goze das coisas que os tolos ousam chamar de pecado.
- Bravo - disse Lord Roni ludibriado pelo discurso do
amigo. Mas logo voltou a si. - Mas agora saia de minha casa. A lua já reluz no
céu. O chá está frio. Tu estás delirando.
- Tudo bem! Tudo bem! Então me retiro. Até a próxima
conversa, meu amigo.
Noite
As palavras de Lord Ernest retumbavam na mente de Roni.
“Maldito libertino retórico. Conseguiu confundir minha mente. Sinto meus
pilares ruírem. Escuto sons estranhos rompendo minhas entranhas.” Pensava de
olhos fechados, num torpor entre sonho e realidade.
O Nascimento
- Senhor! Senhor! - adentrou quarto adentro Jurema
ofegante.
- Que foi, mulher? Por que me acordas a esta hora?
- Nasceram. Nove roliços porquinhos.
- Oh céus. Vamos. Vamos ver meus pequenos.
Vestiu um roupão e saiu apressado. Ao chegar onde Linda
repousava. Viu os lindos filhotes, alguns já a amamentar-se.
Foi pegando um por um nas mãos. Observava-os
cuidadosamente.
Eis então que um deles chama sua atenção. O porquinho
tinha uma mancha negra e discreta no centro da testa. Logo passou pela sua
mente as palavras de seu amigo Ernest. “Maldito, será que teria sido capaz de
profanar minha Linda?” Pensou raivosamente consigo.
Ficou inquieto. Imaginou a terrível cena. O próximo chá
seria diferente.
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