Novamente encontro-me frente à tela do computador, é
o primeiro frio depois da última chuva.
Não há nenhuma mosca me incomodando, não há nenhum
barulho me estorvando.
O silêncio é tão grande que posso ouvir minha
própria respiração.
Sinceramente eu não saberia o que escrever se a
mosca não houvesse aparecido aquele dia, assim como não sei o que escrever
agora.
Ainda não me culpo pelo estupro fatal de meu
peteleco, nem pelo sofrimento agonizante que antecedeu sua morte.
Culpo-me apenas por não ter aprendido a viver em
harmonia com a mosca, sem ela não sei o que escrever. Mas já é tarde demais.
A mosca está morta, sinto que em breve eu estarei
também.
Nenhum cadáver vira zumbi no mundo real, nem o meu e
nem o da mosca. Quando mortos, somos todos iguais e isso me leva a concluir que
as diferenças que concebi em vida eram apenas ilusórias.
Moscas não viram chimpanzés antes de morrer e nem o
contrário, mas o cadáver de um chimpanzé é sempre tão morto quanto o cadáver de
uma mosca.
Logo a diferença em vida era apenas ilusória, se as
contingências da história natural fossem diferentes, talvez, então, eu é que
teria sido vítima fatal do peteleco da mosca e aposto que ela também não
sentiria pena de mim.
Não importa se é chimpanzé ou mosca, cada um em vida
não passa de um cadáver adiado.
Enquanto cadáver adiado, o tédio “nadificar-me”.
Esse nada sem sentido que agora sou pode apenas
lembrar-se com carinho dos tempos em que a mosca não estava morta e caçá-la com
petelecos era um sentido que me fazia existir.
O ódio que nutri por ser um chimpanzé coexistindo
com uma mosca acabou, talvez se ao invés de ódio eu tivesse amor na
coexistência; a mosca ainda estaria aqui, dando-me motivos para existir,
talvez.
Hipóteses de um passado melhor
nunca servirão para melhorar meu presente. Sou um chimpanzé aqui. Sem ódio, sem
amor, sem mosca e sem nada além de todo o meu niilismo.
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