As pessoas aproximam-se pala similaridade, aquela
conversa que alguns e algumas gostam de vomitar, aquela coisa sobre “gostar de
pessoas estranhas ou peculiares ou excêntricas”, isso é outra fantasia, ou
melhor, outro reboco de hipocrisia morta e apodrecida; todos fogem do que não é
igual, daquilo que transpira diferença, se assim não fosse, todos andariam
abraçados com aqueles tipos estranhos que vêm pedir cigarros na rua, ou
beijariam as velhas sujas que mergulham nos contêineres de lixo das cidades urinadas.
Afinal, do que serve querer o que não é diferente? Absolutamente nada,
do que serve alguém que é igual a mim? O estranhamento é o prazer máximo, o
estranhamento ativa os “locis
transcendentais da alma”, sem o estranhamento, acabamos por transar com nós
mesmos. Todavia, a similaridade, a fantasia enlatada em seres programados para
a imitação, grita e estoura os ouvidos com sua voz esganiçada, e nós ouvimo-la
sempre e nós repetimos sempre: “sou diferente”; “sou estranho”. Porque a
singularidade também reina.
E ela fica ali, hermética e narcisista, enganando-nos no trabalho, no
banheiro, no bar, nas relações, nas transas boas e ruins, nos comentários com o
amigo gay no almoço da faculdade. Falamos como se nossas especulações fossem
inéditas, ejaculamos e beijamos como se fossemos os primeiros, imprimimos essas
sensações fugazes nos ossos e na mente, aperfeiçoamos nossos delírios sociais,
planejamos sem nem perceber; tudo impulsionado pela força da falsa fantasia da
singularidade.
Quando percebemos, aquela pessoa em verdade não nos cativa, não nos
atrai, ela não passa dum homúnculo defeituoso, uma pária dispare que nos é
estranha por ser tudo menos similar, menos igual, por ser em essência singular,
contudo cópia d’outros que não me são cópias, mas que, contudo, replicam
múltiplas facetas que por mim jamais serão assimiladas, e que por isso mesmo me
são tão atraentes.
Todavia, a atratividade, além
de não ser uma escolha – como há muito já se sabe –, é gerada em quase todos pelo
fenômeno inverso, pela fantasia da singularidade guiada pela força da
similaridade.
E foi por meio desses fenômenos corriqueiros da vida que eu conheci
minha atual namorada. Em tudo busquei explorá-los, em tudo simulei a
singularidade e a similaridade. Ela se dizia estranha, contudo ouvia e via o
que outras cem milhões de pessoas ouviam e viam, ela dizia gostar de mim, até
mesmo me “amar” pelo que sou, todavia o mais leve resquício de não semelhança
entre o meu comportamento e seus gostos causava-lhe repúdio. Por fim, chegamos
à conclusão de que não tínhamos “nada em comum”.
E por que diabos deveríamos ter “algo em comum”? Não quero ter algo em
comum com ninguém, pessoas que têm algo em comum comigo não passam de cópias
minhas que repetirão somente aquilo que eu já sei. Eu quero o incomum, o
grotesco, o mórbido, o surpreendente, o inesperado, o exótico, o chulo; não o
que eu já tenho, o que eu já domino, pois aquilo que se detém é a mais
desprezível das posses, ao contrário do que se perde, do que se torna dourado sobre
a brasa rubra quando levado por mãos alheias.
No fim não seria isso também uma fantasia de singularidade?
Masturbo-me ante algumas fotos caseiras e sinto-me único, pois eu não penso n’outros
tantos que fazem o mesmo, é, é, eu conservo a fantasia e sinto prazer com ela,
sou um reprodutor da minha crítica, um repetidor do mal, da comum e da vulgar
fantasia da singularidade e seus desmembramentos prazerosos e molhados.
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