- Gosto de fumar depois de uma foda, me sinto num filme de Holywood.
- Sério? Interessante...
O suor estava no ar, a camisinha gozada no chão, o casal numa cama de motel.
- Que tu faz mesmo?
- Sou filósofo.
A face dela contorceu-se, como se a sua cabecinha de puta tentasse puxar do rosto a resposta à pergunta que por lá corria solta: Que porra um filósofo faz?
- Você deve estar se perguntando: Que porra um filósofo faz?
Fiz aquela cara de “sei”.
-Bem... Uma porra que o filósofo faz está bem ali no chão...
Apontei para a camisinha. Ela riu da graça, eu não, pois não era engraçado.
- Outra porra que o filósofo faz é porra nenhuma.
- E quem te paga pra fazer nada!?
- Me dê um cigarro, sim?
Acendi o Malboro, odeio Malboro, quem jogou Final Fantasy VIII sabe do que estou falando...
- Quem paga? Você paga, seu pai, sua mãe, seus amigos, a sociedade inteira, em suma, a universidade me paga. Nossa sociedade tem uma tendência insidiosa em pagar por coisas que não usufrui. Mas isso é só uma “faceta de borda” do capitalismo e da democraria. Democracia! Eis algo que os filósofos fizeram!
- DeMoGraFia!? Não é aquela coisa do IBGE? Tem a ver com densidade... Ah... Eu sei... Aquela coisa com habitantes...
O morticídio de neurônios estava em alta.
- Isso, isso. O dia em que a Globo não passar a novela, vai numa biblioteca e procura por Aristóteles, começa por ai, é sempre bom tem um embasamento histórico, mas o cara que teve a ideia mesmo foi um tal de Sólon.
Olhou para baixo, depois para o lado, parecia que o entendimento seria encontrado ali, no chão vulgar dum motel barato. Ou sou arrogante em demasia ou não ensinam nada nas escolas hoje em dia. Acho que os dois são verdade.
- Mas os filósofos não acreditam em Deus, né?
- Depende.
- Do que?
Observei a fumaça fundir-se ao ar, relaxante.
- Se eles aceitam ou não a sua condição.
- Condição?
A empreitada seria difícil, mas eu já estava cansado de foder, então... Vamos lá.
- Nós, seres humanos, somos classificados pela Taxonomia, resumidamente, da seguinte forma: pertencemos ao Reino Animalia, o mesmo da barata; à Classe Mammalia, a mesma do cachorro; à ordem Primata, a mesma do chimpazé. Quimicamente somos compostos basicamente, como todo estudante de ensino médio deve saber, por Hidrogênio, Oxigênio, Carbono, Nitrogênio e Fosfóro. Matéria comum, encontrada em coisas como o ar, a água e sacolas plásticas. Temos mais de 90% de similaridade genética com ratos, por isso eles são usados como cobaias de laboratório. Evidências arquiológicas apontam que nossa espécie tem cerca de cinqueta mil anos, enquanto que pela datação radiativa a Terra tem cerca de quatro bilhões e meio de anos. A diferença é bem grande, até você deve ter percebido. Isso mostra que estamos longe de sermos a primeira coisa que surgiu nesse lugar e que a nossa existência é somente uma linha insignificante no tecido do tempo.
- Tá, mas o que isso tem a ver em acreditar em Deus ou não?
- Tudo. Tenha em mente o número de estrelas existentes, que essas estrelas são órbitadas por um número ainda maior de planetas. Não parece absurdo assumir que possa existir vida em outros pontos do Universo e que essa vida possa ter inteligência similar a nossa, mesmo que a chance seja algo tendendo a zero, ou seja, ser improvável não implica em ser impossível. Agora tente responder a seguinte pergunta: há alguma razão especial para pensar que o planeta onde vivemos é importante ou que a nossa espécie tem para si reservada um destino primoroso ou único?
- Sim! Primeiro, é o nosso planeta! Segundo, somos especiais por causa da nossa inteligência.
No meio daquelas respostas programadas a mulher conseguiu acertar uma palavra, como esperado.
- Exatamente! O “NOSSO”. Essa palavra é fundamental, pois nela reside toda a arrogância da espécie humana. Pensamos que somos importantes, superiores a todos os outros seres viventes conhecidos, mas nunca paramos para observar a verdade incoveniênte convenientemente ignorada. Como a ignoramos? Simples! Criando historietas para justificar nossa existência e torná-la importante, compilamos esses continhos rabuscados e os chamamos de Bíblia Sagrada, Torá, Alcorão... Depende da cultura. Depois ficamos discutindo uns com os outros para saber quem fez o melhor texto alegórico. Nessa parte ouvimos muito a dita palavra da discódia: “NOSSO” Deus! Ela pode apresentar-se no plural ou com outro gênero, o que importa é deixar claro que o NOSSO é correto e o de vocês errado, que o NOSSO é importante e o de vocês não.
“Que porra esse cara tá dizendo?!” Deve estar pensando essa puta. Não importa. Depois de buscar algumas observações no seu banco de dados construído à base de programas televisivos de domingo, ela mandou uma divagação prosáica ligada a um questionamento reducionista:
- Deve ter alguma verdade. Alguém deve estar certo, não?
- A minoria está certa, como sempre. Certo! Mas vivemos numa democracia, então a maioria está certa, ou se tanta gente diz então deve ter alguma verdade. Você pode estar pensando, erro comum. Para nos covencermos que a maioria é composta por biócios comedores de trigo e frequentadores de circos, basta pararmos por um momento para observar a História: a marioria dizia (alguns ainda dizem!) que a Terra era plana; que um aparelho mais pesado que o ar era incapaz de voar; que os microornismos surgiam expontaneamente do nada; que as doenças eram causadas por falta de fé; que o nosso planetinha era o centro de tudo e até, veja só a que ponto nossa arrogância nos levou, que éramos seres tão importantes que poderiamos voltar à vida ou que a vida era somente um teste para alcançarmos uma existência superior no pós-morte!
Observando sombras, Eratóstenes provou que a Terra não era plana; os irmãos Wright construiram um aparelho mais pesado que ar e, veja só, ele voou! Mesmo que para tanto precisasse ser catapultado; Pauster demonstrou, com seu famoso experimento, que a biogênese era baboseira de religioso travestido de cientista; o desenvolvimento da ciência médica deixou claro que boa parte dos males que afligiam nossos organismos insignificantes eram consequências da ímundice e do desconhecimento do ciclo de vida de parasitas, não falta de ave-marias e pai-nossos; Galileu Galilei afirmou com base em observações astronômicas que essa rocha intergalática chamada carinhosamente de Planeta Azul era só mais um aglomerado de matéria na imensidão do Universo; finalmente, o fato de não vermos faráos egípcios zanzando pelas ruas deve ser o suficente para nos convercermos que animal algum volta à vida, afinal, por que eu deveria dar mais atenção às promessas de vida eterna ofertadas hoje em dia em detrimento às prometidas por religiões não comuns ao meu núcleo cultural? Só o que mudou foi a forma de conceber e difundir a crença, ou seja, ela foi forçada à metamorfose por conta de novas concepções da realidade.
Por que fomos e ainda somos vítimas dessas afirmações absurdas? Por que certas pessoas as aceitam e outras não? Simples: arrogância. Tomar a mentira por verdade, crer ao invés de ser convencido, aceitar sem antes criticar, manter constante o que não mais apresenta resultados. Saber escolher entre essas opções não separa somente o tolo do não tolo, separa o arrogante do humilde. Muitos dos ditos humildes, como aquele cabeludo do Jesus Cristo, são em verdade arrogantes, ora! Lembre-se de certa frase sopostamente dita pelo nazareno: “ninguém vai ao pai se não por mim”. Hulmildade? Aonde? Isso é arrogância e desconhecimento da própria condição de mero animal, de mero amontoado de matéria. Essa é uma das verdades incovenientes: arautos da boa aventurança, como o filho de Deus e correlatos (cada cultura tem o seu), não passam de egocentricos e especistas.
Fazer a opção sensata diante dos fatos é o que define se somos conhecedores da nossa condição ou se somos somente mais um macaco sem pêlos arrogante e crêdulo que passa a vida balançando-se de galho em galho em busca de comida, sexo e diversão; ou, para adequar a analógia à arrogância e aos costumes do bicho moderno: fast food, baladas e televisão.
- Tu falou em dEmOgRáfia outra vez, né? O que o IBGE tem a ver com isso tudo mesmo?
Cocei minha barba mal feita, joguei o cigarro fora, lembrei que não fumava. Esbocei um sorriso sem dentes.
- E então? Vai fazer o que depois?
- Ah! Nooosa! Trabalhei horrores hoje, sabe? Mas quando a gente terminar eu ainda vou passar no MC Donalds pra recarregar as energias, encontrar meu namorado na Boate, fazer a última da noite e depois ir pra casa assistir um pouco de TV! E sabe que eu acho Jesus um homem bom, tu NÃO pode negar! Ele morreu por nós & blá, blá, blá, blá, blá, blá...
Ela desandou a falar coisas sem embasamento ou sutentação lógica, com frequência sem nenhum dos dois. Se trocassemos as palavras Deus e Paraíso por Papai Noel e Presente, respectivamente, teriamos a sensação de que era uma criança “argumentando” sobre como havia sido boazinha durante o ano e que portante deveria ganhar uma recompensa, a sensação tornava-se totalmente predominante ao trocarmos ano por vida...
Respirei fundo. Soltei o ar devagar. Olhei para a camisinha, então lembrei: que porra faz um filósofo?
- Certo guria... certo guria... Agora pega esse cem, cala a boca e chupa.
Nas palavras de Mr. Aplle a Hot "chuta o balde" de porra imoral em cima da sociedade hipócrita.
ResponderExcluirUm conto que não é para qualquer um ler.
Barbaridade!
ResponderExcluirComo tem gente ignorante no mundo... Eu convivo umas 15 horas por semana com uma velha que pensa dessa mesma forma. Vou imprimir esse texto e deixar de canto pra ela ler... huahauhauhauha...
Pensando bem, duvido que ela entenda.
=\
Falo bonito!
ResponderExcluircara a história ta muito bem escrita.
Só tenho uma coisinha pra falar, o texto inicial do blog pode intimidar certas pessoas[e isso é muito bom, só assim não regurgitam merda..:D] a participar desse blog, bom eu não sou um cara de muita leitura, faço faculdade de física, ou seja números e números; poucas palavras.
Adoro filosofia, e os textos desse site, primeira vez que to comentando, por que fiquei com um certo receio de ser igual a essa menina, sou bastante leigo no assunto [história da filosofia], porem, eu já li sobre a filosofia e eu "aprendi" a ser uma pessoa mais humilde.
e de fato, conviver com pessoas assim é foda, mas é o certo, a final, os humildes da história é que enxergam o quanto essas pessoas são retardadas ^^
Filosofia, ser amigo do conhecimento, requer amar o belo, o que inclui gozar com o exemplar dele. Por isso, o filósofo só começou a agir bem quando encheu a boca da mulher e calou a sua própria.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirO filósofo só fala merda, a garota também; parece que o Mundo é um mero vaso sanitário entupido.
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